Pensar no papel social desempenhado pelas mulheres na sociedade brasileira, mais especificamente sob a ótica da política, é um exercício necessário quando se coloca o tema da reforma política na berlinda.
Essa discussão é extremamente importante hoje no país, quando ainda sentimos vivos resquícios de uma sociedade sob a égide do patriarcalismo e do machismo, na qual os espaços do homem e da mulher sempre estiveram bem definidos: o espaço público para ele e o privado para ela.
O papel social da mulher e sua posição na sociedade brasileira ainda são permeados de contradições. E na política, pergunto, ainda temos um espaço fechado, compartilhado apenas entre os homens? A resposta poderia ser sim e não, dependendo do interlocutor ou do ponto de vista.
Em termos históricos o espaço feminino na política está se expandindo mas não nas proporções esperadas, se considerarmos o crescimento do eleitorado feminino e a criação de normas legais garantindo sua participação.
Embora representem 51,7% dos eleitores brasileiros, a participação das mulheres é de apenas 9% na Câmara dos Deputados e 10% no Senado. São Paulo, a maior cidade do país, possui os mesmos 9% de vereadoras na Câmara Municipal. No Poder Executivo, a situação não é diferente: das 26 capitais, somente duas têm mulheres como prefeitas.
Isto nos coloca, de acordo com estudo da ONU, no 120º lugar em um ranking da proporção de mulheres nos parlamentos no mundo, o que significa estar atrás de países islâmicos, mais ou menos ricos, como Afeganistão, Paquistão, Sudão, Iraque ou Emirados Árabes Unidos, onde a vida das mulheres, como se sabe, nao é um mar de rosas.
Como exemplo a ser seguido nada melhor que o da África do Sul, que após anos e anos de apartheid votou e aprovou leis que efetivamente garantem hoje que metade dos cargos públicos do pais sejam ocupados por mulheres.
O que acontece com as mulheres na política no Brasil ? A tímida representação feminina no Poder Legislativo se manteve inalterada mesmo depois da aprovação da lei eleitoral 9.100, promulgada em 1995, segundo a qual 20% dos postos deveriam ser ocupados pelas mulheres. Em 1997 foi alterada para o mínimo de 30%.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu, em 2010, que os partidos e coligações que não obedecessem a proporção mínima de mulheres disputando o pleito nas eleições, seriam obrigados a se adaptar, adicionando candidatas ou cortando candidatos. Os partidos, no entanto, encontram maneiras de “cumprir a lei” completando suas listas com “falsas” candidatas que, na verdade, não fazem campanhas, entre outros expedientes.
Quando observamos a situação das brasileiras na esfera da política do país na última década, o primeiro aspecto a destacar é, sem sombra de dúvida, o fato histórico e inédito da eleição de Dilma Rousseff.
Em 2010 o Brasil elegeu, pela primeira vez, uma mulher para a Presidência da República e com isso, entrou para um seleto grupo de países de democracia representativa que tiveram ou têm uma mulher como presidente, e nos quais se destacam nações latino-americanas. Em 2010, cinco mulheres ocupavam esse cargo na região.
Além de eleger uma mulher, os brasileiros (as) deram 70% de seus votos para mulheres – Dilma Rousseff e Marina Silva. Esse importante fato histórico não foi acompanhado, porém, de grandes mudanças nos outros níveis eleitorais nos quais ocorreram eleições, seja para o Executivo ou para o Legislativo.
Os outros resultados persistem num padrão quase sofrível. A persistente sub-representação das mulheres nos espaços de poder no Brasil é fato reconhecido pela literatura e comprovado por inúmeros dados estatísticos.
As direções partidárias deveriam estar atentas à voz das ruas neste aspecto. Oito em cada dez brasileiros ouvidos pelo Ibope e pelo Instituto Patrícia Galvão (78% dos entrevistados) , este ano, para uma pesquisa sobre a presença de mulheres na política defenderam a obrigatoriedade de uma divisão meio a meio para candidatos e candidatas nas listas partidárias para eleições, no Legislativo municipal, estadual e federal.
De um total de 1,6 mil entrevistados, cerca de 1,4 mil considerou fundamental a alteração nas leis eleitorais para garantir que as mulheres representem a metade dos candidatos a cargos eletivos.
O fato de a maioria dos entrevistados associar a democracia a uma divisão mais equilibrada entre a participação de homens e mulheres nas listas partidárias evidencia que a sociedade acredita que não existe processo democrático sem democracia de gênero e sem a participação das mulheres.
Para 74% dos entrevistados, a garantia da democracia depende da presença de mais mulheres nos espaços de poder e a tomada de decisões, enquanto 1,5 mil deles defendem punição para os partidos que não apresentarem uma lista com 50% de candidatos e 50% de candidatas.
Esta é uma reflexão a ser feita: a sociedade quer que as mulheres participem e existe uma legislação determinando os índices mínimos de participação. Por que, então, elas se candidatam menos do que regula a lei, e porquê, uma vez candidatas, tão poucas se elegem? Nas últimas eleições legislativas a média de candidatas à Câmara dos Deputados era de 19% e para as assembleias legislativas 21% do total, ou seja, cerca de 11% e de 9% respectivamente, abaixo da determinação mínima legal.
Os partidos políticos alegam dificuldades em atrair as mulheres para seus quadros mas segundo estudo do IBGE, o fenômeno não decorre da carência de mulheres aptas a concorrer, mas sim do modo como os partidos são organizados, efetivamente controlados por homens, dando pouco espaço para mulheres estruturarem suas campanhas.
Os resultados do processo político acabam desestimulando as mulheres. Sem o devido apoio das direções partidárias, a proporção de candidatas efetivamente eleitas é muito baixa. Em 2010, por exemplo, apenas 4,9% das candidatas que participaram das eleições à Câmara Federal e às Assembleias Legislativas se elegeram.
Comparada à situação brasileira na economia, nos esportes e na ciência, e ao crescimento da participação da mulher em todos estes setores, o baixo nível de participação feminina na política é vergonhoso.
Sociólogos acreditam que se os índices de aumento da participação feminina na política continuar no ritmo das últimas décadas, levaremos 150 anos para atingir a paridade, ou seja, mais 15 gerações.
A sociedade brasileira necessita dar o salto qualitativo da democracia representativa para a democracia participativa e as mulheres devem atuar ativamente neste processo. Deixo aqui um apelo às mulheres, guerreiras de todas as horas, que se juntem aos homens nessa batalha; e aos dirigentes homens e mulheres de todos os partidos que abram alas às mulheres que estão prontas a participar porque nesta luta, certamente, elas tem uma imprescindível e rica contribuição a dar.
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